O Brasil passava por diversas dificuldades
no início dos anos 90, altas taxas de desemprego, hiperinflação, baixo
crescimento econômico entre outras coisas. Um novo presidente havia sido
eleito, o primeiro eleito democraticamente depois de vários anos da ditadura
militar.
O rock passava por uma espécie de ressaca
dos anos 80, após um imenso sucesso comercial, as bandas começaram a ter seu
espaço reduzido na mídia e a vendagem de discos e agenda de shows começavam a
diminuir, tendo a concorrência de outros estilos musicais como a Lambada e o
Sertanejo.
Dentro deste contexto, a Legião Urbana
lançava em novembro de 1991 seu quinto disco, intitulado apenas V, em forma de
algarismo romano. O álbum sucedia As Quatro Estações, que tinha vendido mais de
Um milhão de cópias.
O disco tem uma temática densa,
influenciada pelo polêmico Plano Collor, que afetou a vida de milhões de
pessoas e pelos problemas de dependência química de Renato Russo. Renato
costumava dizer que este álbum era similar na discografia da Legião Urbana ao
disco Pornography do The Cure, talvez o mais denso e depressivo da banda.
O Plano Collor I teve entre outras medidas
o confisco do dinheiro da poupança e a mudança da moeda do Cruzado Novo para o
Cruzeiro, com o intuito de acabar com a inflação e de estabilizar a economia,
porém o plano não deu certo e acabou prejudicando muitas pessoas, entre elas o
vocalista Renato Russo.
O disco tem várias referências medievais e
da literatura, já em sua sonoridade tem uma grande influência do rock
progressivo. A primeira música “Love Song” trata-se de um uma cantiga de amor
em português arcaico, composta no século XIII por Nuno Fernandes Torneol.
Renato Russo disse em uma entrevista que a primeira frase da letra da música
“Pois nasci nunca vi amor” descreveria bem a temática do disco.
A música seguinte “Metal contra as nuvens”
mostra o lado mais progressivo do som do disco, um épico de mais de onze
minutos, dividida em quatro partes. Nesta música fica mais evidente a rusga de
Renato com o Governo Collor. Nos trechos “Quase acreditei na sua promessa / E o
que vejo é fome e destruição” ou em “Existem os tolos e existe o ladrão / E há
quem se alimente do que é roubo / Mas vou guardar o meu tesouro / Caso você
esteja mentindo” fica claro o descontentamento do povo com as medidas do
governo.
Nesta música percebe-se a evolução musical
da banda. Mesmo não sendo grandes instrumentistas, o guitarrista Dado Villa
Lobos e o baterista Marcelo Bonfá (considerado por muitos um baterista fraco),
conseguem fazer belos arranjos, mais elaborados em relação aos discos
anteriores da banda.
A música “A montanha mágica” é bem
enigmática, mas dá a entender que fala sobre a dependência química de Renato
Russo. No trecho “Minha papoula da Índia / Minha flor da Tailândia / És o que
tenho de suave / E me fazes tão mal”, possivelmente fala sobre a dependência
química, pois a papoula é uma substância utilizada em alguns alucinógenos.
A música “Teatro dos Vampiros” foi composta
pelo baterista Marcelo Bonfá, sendo a letra feita pelo Renato Russo. Aqui a
temática gira em torno da crise econômica “Vamos sair, mas não temos mais
dinheiro / Os meus amigos todos estão procurando emprego” e a desilusão da
juventude “Voltamos a viver como a dez anos atrás / E a cada hora que passa /
Envelhecemos dez semanas”
“Vento no litoral” talvez seja a música
mais depressiva da Legião Urbana. A letra versa sobre um amor que se foi, com
um clima bem triste. A citação na letra sobre cavalos marinhos pode ter razão
no fato dos casais desta espécie ficarem juntos pelo
resto da vida. Este fato fica no campo da hipótese, dando um ar enigmático à letra da música.
"L'âge D'or" é também o nome de
um filme surrealista de 1930, dirigido por Luis Bunuel. A música conta com belo
slide guitar de Dado Villa Lobos e também cita um trecho que fala sobre drogas
“Já tentei muitas coisas / De heroína a Jesus”.
V é um disco de grandes referências com um
clima pesado e depressivo. Algo que pode ter influenciado a temática do álbum
foi a descoberta de Renato Russo em ser soropositivo. Mais um grande clássico
lançado pela Legião Urbana, talvez a banda que mais tenha marcado a história do
rock brasileiro.
Muito bem explicado. Quem curtiu os outros discos da Legião Urbana, com seus hits dançantes, estranhou um pouco esse trabalho que pareceu ser mais depressivo até mesmo do que o disco póstumo Uma Outra Estação. Mesmo assim, introspectivo e denso, é um álbum muito interessante. Concordo também quanto ao crescimento musical da banda. Faço coro ao achar Bonfá um baterista limitadíssimo, e Dado um guitarrista comum, mas eles se superaram e conseguiram melhorar suas performances.
ResponderExcluirO Renato Rocha chamava o Bonfá de pilha fraca, pois ele começava a música em um ritmo e terminava em outro hehehe.
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