30 de julho de 2014

Morrissey não decepciona em novo disco

O último trabalho de Morrissey foi o bom disco Years of Refusal de 2009, um disco mais cru, com uma sonoridade mais rock, graças também a sua jovem banda de apoio (tirando é claro o companheiro das antigas, o guitarrista Boz Boorer). Este ano finalmente Morrissey lançou seu novo álbum: World Peace is None of Your Bussiness e mostra que ainda está em ótima forma e com muito a dizer.


O novo disco foi produzido por Joe Chicarelli e como banda de apoio Morrissey conta com Boz Boorer na guitarra, Solomon Walker no baixo, Jesse Tobias que já tocou com Alanis Morrissete, na guitarra e Matt Walker, que já tocou com o Smashing Pumpkins, na bateria. World Peace tem uma sonoridade um pouco mais trabalhada que o disco anterior, nos arranjos foram incluídos guitarras espanholas e elementos da música oriental. Um dos poucos artistas com algo a dizer no cenário atual, Moz continua com letras afiadas e com críticas à sociedade e seus governantes.

Na música título do álbum, Morrissey critica a indústria da guerra e a falta de paz no mundo em geral. O cantor continua com sua bela voz e a canção tem elementos que engrandecem sua execução como percussões orientais e solos de guitarras criativos. Na letra, condena a violência policial e a exploração dos governantes, citando até o Brasil: “A paz mundial não é da sua conta / A polícia irá paralisá-lo com suas armas de choque / ou irão te desabilitar com suas armas / É pra isso que o governo serve / Oh, pobre tolo...Cada vez que você vota, você apoia o processo / Brasil, Bahrein, Egito, Ucrânia/ Tantas pessoas sofrendo”.

“Neal Cassidy Drops Dead” fala sobre o poeta da geração beatnik, Neal Cassidy e sua misteriosa morte. Em “I´m not a man”, Moz critica os homens em geral, citando Casanova e Beefaroni. “Istanbul” é outra bela música, com uma percussão oriental e riff de guitarra envolvente. “Earth is the loneliest planet” tem guitarras espanholas misturadas com guitarras com wah wah, com vocais femininos, em uma letra que fala sobre a solidão no planeta.

“Staircase at the university” é uma canção típica da carreira solo de Morrissey e fala sobre uma garota que se joga da escadaria e arrebenta a cabeça. A influência da música flamenca também aparece nesta canção. “The bullfighter dies” é sobre um toureiro que morre durante uma tourada e todos comemoram: "O toureiro morre / O toureiro morre / E ninguém chora / Ninguém chora / Porque todos nós queremos que o touro sobreviva”.

“Kiss me alot” é uma das melhores músicas do disco, com refrão que fica na cabeça e com belos metais que engrandecem a canção.Smiler with knife” é mais calma e acústica, enquanto em “Kick the bride down the aisle” Moz fala para uma noivo chutar a noiva do altar, pois ela só está interessada na grana dele. O disco termina com a épica “Oboe concerto”.

Em World Peace is None of Your Bussiness, Morrissey não decepciona e continua o padrão de qualidade de sua discografia solo, que tem alguns discos de menor qualidade como Kill Uncle de 1991 e Southpaw Grammar de 1995, mas que no geral tem discos bem interessantes. Sem dúvida um dos poucos nomes do rock com alguma relevância na atualidade.






28 de julho de 2014

Grandes nomes do rock alternativo dos anos 90

Os anos 90 foram muito interessantes para o rock, talvez tenha sido a última grande década do estilo, com inúmeras bandas de qualidade surgindo e ganhando destaque. Nos Estados Unidos, ocorreu um fenômeno no cenário underground, as bandas começaram a se destacar e assinarem com grandes gravadoras, sem necessariamente mudar de estilo. Estes grupos conseguiram até boas vendagens e deixar sua marca na história da música, mesmo com o espírito underground. Vamos relembrar algumas destas bandas e algumas de suas melhores músicas.

Buffalo Tom


Formada em 1987, a banda Buffalo Tom é formada pelo vocalista Bill Janovitz, o baixista Cris Colbor e o baterista Tom Maginins. Seu som é muito influenciado por bandas como Dinossaur Jr. e Hüsker Dü, também pelo country rock de bandas como Buffalo Springfield entre outras. No início o som da banda era mais sujo e punk, mas com o tempo as canções foram ficando mais tranquilas e trabalhadas, destacando a marcante voz de Bill Janovitz. Entre os principais “quase sucessos” do grupo, podemos destacar as músicas “Summer” e “Tailights Fade”. Seu último disco foi lançado em 2011 e a banda existe até hoje.





Sugar


Bob Mould, ex-vocalista do Hüsker Dü formou uma nova banda em 1992, o Sugar. Com um som mais melódico e menos “esporrento” do que sua banda anterior, Mould lançou três trabalhos com a banda, Copper Blue de 1992, o EP Beaster em 1993 e File Under Easy Listening de 1994. Copper Blue foi eleito um dos melhores discos de rock alternativo dos anos 90, gerando hits como “Helpless” e “If I could change your mind”. Após o término do grupo, Mould seguiu em carreira solo e lanço seu último disco, Beauty and Ruin este ano. Leia a resenha aqui.





The Lemonheads


Formado em 1986, o Lemonheads é liderado pelo vocalista, guitarrista e galã Evan Dando. Com muita influência do rock dos anos 60 e o rock de garagem dos anos 80, o grupo tem um som muito melodioso e com guitarras distorcidas. O nome da banda foi tirado de uma famosa marca de balas dos Estados Unidos. Seu disco de maior sucesso, It´s a Shame About Ray, de 1992, gerou alguns sucessos, o maior deles o cover de Simon & Garfunkel, Mrs. Robinson, música que fez parte da trilha sonora do relançamento do filme “The Graduate”. A banda ainda está na ativa e seu último disco de estúdio foi lançado em 2009.





Grant Lee Buffalo



Formado em 1991, O Grant Lee Buffalo é um power trio com uma sonoridade um pouco diferente das bandas dos anos 90. O som deles é mais puxado para o folk, de artistas como Neil Young e Bob Dylan, misturados com guitarras distorcidas e muita melancolia. Seu primeiro álbum, Fuzzy, de 1993 é um disco obrigatório para quem quer conhecer o rock alternativo da década de 90. Após 4 discos com o Grant Lee Buffalo, o vocalista Grant Lee Philips seguiu em carreira solo e a banda se reúne esporadicamente para alguns shows.





The Breeders


Antes mesmo do fim do Pixies, a baixista e vocalista Kim Deal criou, junto com sua irmã gêmea Kelly Deal, a banda Breeders. Em 1990 saiu o disco Pod, produzido por Steve Albini. Este álbum era um dos favoritos de Kurt Cobain, influenciando bastante a sonoridade do disco In Utero do Nirvana. O maior sucesso do Breeders sem dúvida nenhuma foi o disco Last Splash de 1993, graças ao improvável hit “Cannonball”. A banda tocou no Brasil ano passado e no Setlist rolou o Last Splash na íntegra. Fora dos Pixies desde 2012, agora Kim Deal pode se dedicar totalmente a própria banda, juntamente com sua irmã.





23 de julho de 2014

Top 10 Duran Duran

O Duran Duran foi formado em 1978 em Birmingham na Inglaterra. A banda desde o começo sabia o que queria e sempre investiu na parte visual, se vestindo bem e com uma preocupação com os vídeos, que eram superproduções, com modelos e efeitos especiais. O sucesso sempre foi a grande meta da banda, mas isto não queria dizer necessariamente que a banda faria uma música descartável, muito pelo contrário, com o tempo o Duran Duran mostrou que era uma banda com muita qualidade musical.


A banda apareceu na onda do movimento New Romantic, que tinha como características o uso de sintetizadores, linhas de baixo marcantes e bateria eletrônica, além desta preocupação estética. Muito influenciados por David Bowie, Roxy Music e Velvet Underground, o Duran Duran conseguiu construir uma sólida carreira, com muitos sucessos e grandes videoclipes. Na ativa até hoje, a banda lançou 13 álbuns e continua em turnê sempre com casas lotadas. Vamos lembrar agora dez grandes momentos desta grande carreira.

“Rio” (Do álbum Rio de 1982)



“Planet earth”  (Do álbum Duran Duran de 1981)



“Come undone” – (Do álbum Duran Duran - The Wedding Album de 1993)



“Save a prayer”  - (Do álbum Rio de 1982)



“Breath after breath” – (Do álbum Duran Duran - The Wedding Album de 1993)



“Girls on film” - (Do álbum Duran Duran de 1981)



“Hungry like a wolf” - (Do álbum Rio de 1982)



“Ordinary world” - (Do álbum Duran Duran - The Wedding Album de 1993)



“A view to a kill” – (Single)



“Perfect day” – (Do álbum Thank You de 1995)



21 de julho de 2014

Grandes discos de 1994 – Live Through This

O ano de 1994 foi muito traumático para Courtney Love: seu marido, Kurt Cobain se matou no mês de abril e em junho a baixista de sua banda, o Hole, Kristen Pfaff, morreu devido a uma overdose de heroína, aos 27 anos. Mesmo com todas estas tragédias, conseguiu se destacar ao lançar o segundo trabalho de sua banda, Live Through This.


No ano anterior, em janeiro de 1993, o Nirvana esteve no Brasil para shows em São Paulo e Rio de Janeiro. Entre um show e outro, a banda fez algumas gravações em dois estúdios, na maioria demos de novas músicas que iriam fazer parte do futuro álbum do Nirvana, In Utero. Courtney Love aproveitou e levou sua baterista e junto com Cobain gravou algumas demos que fariam parte do disco Live Through This.  

Muito se especulou sobre a participação de Cobain nas composições das novas músicas do Hole. A influência é evidente, a estrutura das novas canções do Hole lembravam bastante as melodias criadas pelo líder do Nirvana, início lento e com guitarra sem distorção, para explosão de guitarra no refrão e muita gritaria. 

O disco foi lançado dia 12 de abril de 1994, menos de uma semana após a morte de Cobain. Live Through This era um pouco mais comercial do que o barulhento disco anterior do Hole, Pretty on the Inside 1991. Aos poucos Love foi conquistando a confiança da crítica e do público, mostrando que não era uma nova espécie de Yoko Ono do rock. As músicas do disco são fortes e ela mostra personalidade a cada canção.

Live Through This foi dedicado também a um grande amigo de Love que morreu assassinado depois de um show do Hole, mais um episódio trágico na vida da polêmica cantora. “Miss World”, primeiro single do álbum, já mostra a vontade de Love de dominar o mundo com seu poderoso rock. Este é o único clipe do álbum em que aparece a baixista Kristen Pfaff, nos outros vídeos já aparece a nova baixista da banda, Melissa Auf Der Maur. 



Segundo diz a lenda, a voz de Kurt Cobain aparece ao fundo de praticamente todas as músicas, mas foi creditada apenas nas canções "Asking for It"  e "Softer, Softest". A força punk de Love se sobressai no disco e a música “Violet” virou um pequeno hino rebelde feminista dentro do rock alternativo.



As influências de Love ficam mais evidentes neste trabalho, principalmente de artistas como Joan Jett e Fletwood Mac. Em “Doll parts” ela desabafa: “Um dia você vai sofrer o tanto que eu sofri”. A última música “Rock star” é na verdade a música “Olympia”. Nela Courtney pergunta: “Você gostaria de estar no Nirvana? Acho que preferiria estar morto”.



Fica evidente ao ouvir o disco que Love pegou muitas ideias emprestadas de seu marido. Porém, isto não tira os méritos dela, Courtney mostra talento cantando com muita raiva e passando suas emoções com muita fidelidade nas músicas. Com Live Through This, a vaca profana de Seattle deixou sua marca dentro da história do rock n´roll.



16 de julho de 2014

Discografia Básica – Rocket to Russia

Semana passada morreu o último integrante da formação original do Ramones que ainda estava vivo, o baterista Tommy Ramone. Um dos fundadores do grupo participou dos três primeiros discos da banda e posteriormente virou produtor e produziu alguns discos do próprio Ramones.

O rock nos anos setenta estava cada vez mais se distanciando de suas raízes. Havia o rock pomposo de bandas como o Led Zeppelin e o rock progressivo do Pink Floyd, com canções longas e cheias de solos e firulas. Se você quisesse ter uma banda de rock teria que entrar em um reformatório e passar horas estudando e tocando guitarra para tocar músicas destas bandas.


Quando a banda foi formada os integrantes do Ramones tinham dificuldade de tocar covers e então decidiram fazer logo de cara suas próprias composições. Músicas simples com poucos acordes, bastante influenciadas pelas raízes do rock, principalmente a surf music e o rockabilly feito nos anos 50. O som feito pelo grupo se tornou então a base do que seria chamado de punk rock alguns anos depois.

Em 1977 o Ramones lançou seu melhor trabalho: Rocket to Russia. Produzido pelo baterista Tommy Ramone e por Tony Bongiovi (primo do “cantor” Bon Jovi), Rocket to Russia é praticamente um Greatest Hits da banda, com muitas músicas que se tornaram clássicas e que seriam dali em diante obrigatórias nas apresentações ao vivo. Este disco foi último trabalho de estúdio com Tommy Ramone nas baquetas.

O disco começa com a incendiária “Cretin hop”, com as principais características do Ramones, poucos acordes, muita energia. O som minimalista é contagiante deixando o ouvinte com vontade de dançar, assim como o rock nas suas origens nos anos 50. “Rockaway beach” é outro clássico, que inicia com o tradicional “One, Two, Three, Four” que consagrou a banda. 



“Here today,gone tomorrow” é mais lenta e mostra a veia melódica do grupo. O Ramones mesmo sendo uma banda punk, nunca abriu mão dos refrões e melodias assoviáveis, o vocalista Joey Ramone sempre foi muito fã dos Beatles e a influência é evidente nesta canção ramonica. Quando ouvimos “I don't care”, percebemos de onde Renato Russo tirou os acordes para a clássica canção da Legião Urbana, “Que país é este?”. Não dá nem para disfarçar a cópia.





“Sheena is a punk rocker” é um dos maiores sucessos do quarteto, um ritmo contagiante e refrão para cantar junto. “We're a happy family” tem uma letra irônica e se encaixa a história dos Ramones, pois o grupo tinha esta identidade de família ou gangue, dos integrantes terem o mesmo sobrenome e o mesmo visual. “Teenage lobotomy” é outro hino ramonico, falando sobre a alienação adolescente.

“Do you wanna dance?” é o primeiro cover do disco, do cantor Bob Freeman. Muito mais energética que a versão de Freeman, se torna um daqueles casos em que o cover fica melhor que o original. “I wanna be well” e “I can´t give you anything”, mantém o pique e a energia do disco, com ritmo acelerado e que dá vontade de dançar.

“Ramona” foi regravada pelo Raimundos, outra banda brasileira que tem muita influência do Ramones. “Surfin´bird” é uma versão de uma canção da surf music e é uma das mais divertidas do grupo, outro exemplo de música que ficou melhor do que o original.

Rocket to Russia é um disco obrigatório para aqueles que querem entender sobre o punk rock e das origens do rock. Um disco que influenciou muita gente e mostrou que para fazer rock n´roll não são necessários muitos solos e firulas e que o rock na sua essência é algo simples e feito para divertir. Obrigado Ramones. 



14 de julho de 2014

Novo disco de Bob Mould é mais do mesmo (e isto é ótimo!)

Bob Mould é um dos nomes mais importantes do rock alternativo norte-americano. A frente do Hüsker Dü nos anos 80 gravou seis discos que influenciaram muita gente. Nomes como Dave Grohl e Evan Dando, do Lemonheads, beberam da fonte de Mould, ou seja, a mistura de punk rock com melodias pop que ficam na cabeça. Nos anos noventa, Mould montou outro power trio, o Sugar e gravou outros dois grandes discos com banda.


Este ano o cantor e guitarrista lança seu décimo segundo trabalho solo: Beauty and Ruin. Depois do bem sucedido Silver Age de 2012, álbum que trouxe Mould novamente à cena do rock alternativo, Bob vem com um disco que traz as tradicionais características que o acompanham desde o início de carreira: canções rápidas e certeiras, com a energia punk na dose certa, muita melodia e o tradicional vocal “enterrado” na mixagem, em meio a paredes de guitarras furiosas.

Mais uma vez com uma versão “Power trio”, baixo, guitarra e bateria, Mould vem acompanhado neste trabalho pela mesma banda que tocou com ele no Brasil em outubro do ano passado (Leia sobre o show aqui). No baixo conta com Jason Narducy e na bateria Jon Wurster da banda Superchunk.

O disco tem uma bela capa, onde têm duas fotos sobrepostas de Mould, uma com ele jovem, fumando um cigarro e a outra ele atualmente aos 53 anos, calvo, com a barba branca e de óculos. A foto em si já explica o título do álbum, a foto de Mould jovem seria a beleza (beauty) e a foto dele atualmente seria a ruína (ruin). Ou seria o contrário?

A primeira canção de Beauty and Ruin, “Low season”, tem um ritmo mais cadenciado, com paredes de guitarras e uma letra reflexiva. A melodia conquista o ouvinte logo nas primeiras audições, mas é um truque de Mould, o restante do álbum tem um ritmo mais acelerado e pulsante. Em “Little glass pill” o ritmo acelera e já temos um punk rock tradicional que Mould faz com maestria deste os tempos de Hüsker Dü. “Kid with a crooked face” é outra pedrada que não deixa o pique cair em nenhum momento.

“I don´t know you anymore” é uma daquelas canções pop perfeitas que Mould sempre tem em seus discos, algo que Dave Grohl faz em seus discos, seguindo a cartilha de Mould. "Nemeses are laughing" tem um ritmo que dá saudade dos anos 90, fase que o rock alternativo chegou ao seu auge. “The war” é outra canção forte do disco, misturando peso e melodia na medida certa.



“Forgiveness” é a mais pop de Beauty and Ruin, com violões uma batida que fica na cabeça e harmonia que dá certa nostalgia. “Hey Mr. Grey” é uma daquelas canções que contam a história de um personagem enquanto “Tomorrow Morning” tem um refrão matador e se destaca na parte final do disco. “Let the beauty be” também tem violões e “Fix It" fecha o disco com muita energia e paredes de guitarra.

Bob Mould neste novo trabalho não abandonou suas principais características como compositor, guitarrista e cantor, fazendo seu som peculiar e sem maiores inovações. Isto é ótimo, neste disco ele dá continuidade a uma bela carreira e mantém o nível do disco anterior, o elogiado Silver Age. Ponto para Mould que prova que o artista não precisa necessariamente se “reinventar” a cada disco para provar sua capacidade. Fazer o que sabe de melhor às vezes é o melhor caminho. 



10 de julho de 2014

Clássicos do Brasil - Os 40 anos do disco Lóki?

Em 1974, Arnaldo Baptista, um dos líderes de uma das mais importantes bandas do Brasil, Os Mutantes, estava em um estado emocional deplorável: tinha saído de sua banda e seu casamento com Rita Lee tinha acabado. Este era o mote para gravar seu primeiro disco solo e um dos discos mais emocionais da música brasileira: Lóki?.


Quando Baptista mostrou as músicas que fariam parte deste álbum para o diretor musical de sua gravadora na época, Roberto Menescal, causou a sensação em Menescal que Arnaldo deveria lançar este trabalho de qualquer forma, para exorcizar estes sentimentos ruins e se livrar desta carga emocional que o atormentava. Outros tempos da indústria musical, em que as gravadoras se arriscavam em projetos musicais audaciosos, sem pensar somente em grandes vendagens.

Para a gravação deste disco, Arnaldo teve o apoio de seus antigos companheiros de Mutantes, Liminha no baixo, Dinho Leme na bateria, além de Rita Lee em alguns vocais de apoio. O álbum é uma coleção de músicas que falam sobre amores não correspondidos, corações dilacerados, além de citações de óvnis e imagens psicodélicas. 

Os arranjos das musicas basicamente só tem piano (tocado com virtuosismo por Arnaldo), baixo e bateria, com eventuais sons de violão. Arnaldo canta quase sussurrando em algumas músicas, demonstrando a fragilidade emocional e psíquica que passava naquela época. O disco ainda teve a participação nos arranjos do maestro e companheiros dos Mutantes, Rogério Duprat.

A primeira música do disco, “Será que eu vou virar bolor” um rock clássico no piano em que Arnaldo traça um paralelo de seu amor, com o destino do rock, dando uma alfinetada até em Alice Cooper. Ambos estão ameaçados de extinção – tanto o seu amor quanto o rock n´roll. “Uma pessoa só” é mais emocional e remete à época em que Os Mutantes viviam em uma comunidade na Serra da Cantareira, em que a ideia de união transformava todos em uma pessoa só. 



Em "Não Estou Nem Aí", Baptista afirma que não tem medo da morte, desafiando-a de forma sarcástica, com um arranjo que flerta com o blues e com o jazz. "Vou Me Afundar na Lingerie" é um blues de primeira linha, que fala em afogar as mágoas, enquanto "Honky Tonky" é uma música instrumental que mostra todo talento da Arnaldo ao piano.

"Cê tá Pensando Que Eu Sou Loki?" é meio samba, meio bossa-nova, aqui Arnaldo desbanca a loucura, sem abdicar das viagens psicodélicas eventuais. "Desculpe" é uma balada dilacerante, um dos momentos mais emocionantes da música brasileira, em que autor se desculpa pelo excesso de amor. “Te amo podes crer” é uma declaração em forma de balada no piano, enquanto “É fácil” é uma balada folk com um estranho riff de violão.

Um dos maiores clássicos da música brasileira completa 40 anos e nos remete a uma das melhores fases da música brasileira, em que a música era tratada mais como arte do que qualquer outra coisa. Seria legal se Arnaldo se animasse a fazer um show tocando este disco inteiro, porém, o eterno mutante se recusa a seguir um setlist fixo em seus shows, tanto que toca as músicas de seus shows no feeling mesmo, escolhe a música que vai tocar na hora do show. 



7 de julho de 2014

Ira! ao vivo no Sesc Vila Mariana

No último final de semana o Ira! fez três shows no Sesc Vila Mariana, sexta, sábado e domingo. Depois de uma polêmica briga e uma separação dolorosa que durou quase sete anos, a banda volta aos palcos para uma turnê de dois anos. Além do vocalista Nasi e do guitarrista Edgard Scandurra, a banda conta agora como músicos de apoio o baterista Evaristo Pádua, no baixo Daniel Scandurra e nos Violões e teclados, Johnny Boy.


A plateia estava ansiosa para o show na sexta-feira, pois muitos ali ainda não tinham visto a banda nesta turnê de retorno (inclusive eu). “Longe de Tudo” abriu o show, primeira música do primeiro álbum da banda, Mudança de Comportamento de 1985. Não demorou muito para a galera se levantar de seus lugares e irem para frente do palco, para ficar mais perto da banda.


O grupo mesmo sem todos seus integrantes da sua formação clássica está com uma ótima pegada, os músicos estão se entrosando aos poucos e arriscando algumas improvisações ao longo do show. Destaque para o baterista Evaristo Pádua, que toca também na banda de apoio da carreira solo de Nasi, um ótimo baterista. O baixista Daniel Scandurra ainda está meio tímido, sendo difícil substituir um baixista com a qualidade e carisma de Ricardo Gaspa.

O show foi engrenando com os hits que vieram a seguir: “Gritos na Multidão”, “É assim que me querem” e “Tarde Vazia”. O público veio abaixo mesmo com a música mais emblemática do Ira!, “Dias de Luta” com o coro tradicional cantando em plenos pulmões pelo público.

Em seguida a banda tocou uma música nova, “ABCD”, com um ritmo legal, porém com uma letra bem fraca para os padrões do Ira!.”Rubro Zorro”, música do clássico disco Psicoacústica, de 1988, foi um dos destaques do show, com a participação especial do trompetista Guizado. O trompetista ainda deu uma canja nas músicas “Mudança de comportamento” e “15 anos”.


Para fechar a primeira parte do show, mais dois clássicos indispensáveis: “Envelheço na cidade” e “Núcleo Base”. Para o bis, a banda deu preferência para alguns “Lados B” do grupo, músicas que não fizeram tanto sucesso, mas que são muito pedidas pelos fãs. No sábado a banda tocou no bis “Prisão das Ruas” do disco Meninos da Rua Paulo de 1991, “Manhãs de Domingo” do Psicoacústica, “Nas Ruas” de Vivendo e Não Aprendendo de 1986 e “Como os Ponteiros de um Relógio”, de seu primeiro disco.


No sábado ainda tocaram “Arrastão” do disco Música Calma Para Pessoas Nervosas de 1993, no bis, que tem um dos melhores riffs de guitarra de Edgard Scandurra (infelizmente perdi este momento, pois não fui no show do sábado) e no domingo ainda tocaram “Você não sabe que eu sou” do disco de mesmo nome de 1998.


O Ira! mostrou com estes shows que ainda tem a pegada de antigamente e acertou ao fazer um setlist que mistura grandes hits com músicas menos conhecidas. Resta saber como está o clima entre Nasi e Edgard Scandurra, se eles voltaram apenas pelo dinheiro ou se conseguiram superar totalmente as desavenças do passado. É a volta triunfante de uma das melhores bandas de rock do Brasil.


2 de julho de 2014

You Are The Quarry – A ressurreição de Morrissey

Em 2004, Morrissey já estava há sete anos sem gravar um disco de estúdio, seu último trabalho até então tinha sido Maladjusted de 1997. Cansado da perseguição de mídia inglesa, Moz decidiu ir morar nos Estados Unidos, em Hollywood no final dos anos noventa.


A maioria apostava que a carreira do cantor estava acabada, mas em 2004 Morrissey finalmente quebrou o silêncio e lançou o disco que iria trazer de volta um dos artistas mais importantes e controversos da Inglaterra. You Are The Quarry teve uma ótima recepção de crítica e de público e se tornou um dos maiores sucessos da carreira do ex-vocalista do Smiths.

A capa do disco já dizia que Moz não estava para brincadeira em sua volta. Com uma metralhadora giratória em suas mãos, como um verdadeiro gângster, o cantor elegia seus maiores desafetos e com letras irônicas e com muito sarcasmo criticava os Estados Unidos, os artistas pop descartáveis, a monarquia inglesa (para variar) entre outros.

Como banda de apoio, Morrissey contou com velhos companheiros, os guitarristas Alain Whyte e Boz Boorer, além do baixista Gary Day, o baterista Dean Butterworth e o tecladista Roger Manning. O álbum foi produzido por Jerry Finn e lançado em 17 de maio de 2004 pela gravadora Attack Records.

Na primeira música, “America is not the world”, Moz faz uma crítica feroz aos Estados Unidos e ao governo Bush: “Estados Unidos / Sua arrogância é enorme / Porque, Estados Unidos / Sua barriga é grande demais / E eu te amo / E só espero que você fique onde está”.

“Irish blood, English heart” foi o primeiro single do álbum, na letra Morrissey fala de sua ascendência Irlandesa e critica a monarquia inglesa e os regimes totalitários: “Eu sonho com um tempo em que / Os ingleses estejam enjoados dos Trabalhistas e dos Conservadores / E cuspam sobre o nome de Oliver Cromwell / E condenem esta linhagem real / que ainda o saúda / E o saudará para sempre”. 



Morrissey sempre teve títulos de músicas fantásticos, mas em “I have forgiven Jesus” (Eu perdoei Jesus), o cantor exagerou na dose. Na letra o velho Moz perdoa Jesus por ter dado tanto desejo a ele, sem que ele pudesse usar este desejo com alguém, afinal o cantor sempre falou sobre solidão desde sua fase no Smiths.



“I´m not sorry” é uma canção linda, em que o cantor fala que não se arrepende de nada e que não está em busca de ninguém e ainda reclama que a mulher (ou homem?) dos sonhos dele nunca apareceu. "The World is Full of Crashing Bores" fala como o mundo está cheio de gente chata e inútil, criticando também os artistas pop descartáveis: “Este mundo está cheio / Completamente cheio de gente muito chata / E eu devo ser um / Porque nunca ninguém se vira para mim e diz / Me tome em seus braços / Me tome em seus braços /E me ame.... Não, são apenas mais pop stars de boca fechada / Mais substanciosos que merda de porco / Nada a transmitir / Eles têm tanto medo de mostrar inteligência / Isso poderia embaçar suas adoráveis carreiras”.

"First of the Gang to Die"  foi outro single de sucesso do álbum, com uma letra que fala sobre um personagem de uma gangue que acaba morrendo heroicamente. “Let me kiss you” é uma das músicas mais bonitas lançadas pelo cantor, tanto que figura em seu Setlist até hoje. “All the lazy dikes” ou “Todas as sapatonas preguiçosas” é outro título que entra para a galeria de melhores da carreira de Moz.



You Are The Quarry foi um sucesso e recolocou Morrissey no topo das paradas inglesas, transformando o cantor em um dos poucos artistas a ficarem em primeiro lugar nas paradas em três décadas diferentes. Com arranjos bem elaborados e Moz cantado bem como sempre, o disco marcou o retorno de um dos artistas mais emblemáticos de todos os tempos. Morrissey comentou pouco antes de lançar o disco que se fosse para alguém ser Morrissey, que fosse ele mesmo. Um dos melhores trabalhos solos do cantor, sem dúvida.