31 de agosto de 2015

Unknown Pleasures – Um disco definitivo

Em 1979 a banda pós-punk Joy Division lançava seu primeiro disco, Unknown Pleasures. O álbum foi gravado no Strawberry Studios em Stokport com a produção de Martin Hannet. O grupo optou em lançar o disco pela pequena gravadora Factory Records, mesmo tendo sido assediados por grandes corporações. A banda queria mais independência artística, ao contrário de bandas como o The Cure, que já estava em uma grande gravadora e já tinha que mudar sua direção musical (Aliás, o The Cure não ia muito com a cara do Joy Division, talvez por esta liberdade que o Cure não tinha).


A banda não tinha muito tempo e nem dinheiro por isto as gravações foram rápidas, sem muita enrolação e regravação de instrumentos. A capa do álbum virou um ícone do rock, trata-se de um gráfico de sinal de rádio captado por um telescópio. A ideia da capa foi do guitarrista Bernard Sumner e ela virou referência para muitos artistas, com sua arte minimalista e misteriosa.

“Disorder” abre o disco com um ritmo pulsante, com uma linha de baixo fantástica de Peter Hook e logo após entram os riffs de guitarras certeiros de Sumner. Na letra, Ian Curtis divaga sobre seus conflitos interiores: “Podem estas sensações me fazerem sentir os prazeres de um homem comum? / Estas sensações mal me mantêm interessado para outro dia / Eu peguei o espírito, perdi a sensibilidade, ignoro a surpresa”.



“Day of the lords” é lenta e arrastada, propositalmente e uma das mais pesadas do disco. O produtor Martin Hannet adicionou teclados na mixagem final a contragosto dos integrantes, mas o resultado final foi excelente, Peter Hook afirmou que Hannet estava certo, pois os teclados suavizam e melhoram a música.

Hannet reclamou durante as gravações que a banda ainda não tinha músicas suficientes para o álbum e forçou os integrantes a comporem mais duas músicas. Mesmo contrariados, o baterista Steve Morris e o baixista Peter Hook compuseram mais duas canções, que seriam “Candidate” e “From safety to where”, sendo que a segunda ficou de fora do álbum. O guitarrista Bernard Sumner não gostou de “Candidate” e gravou as guitarras com extrema má vontade com uma guitarra bem “econômica”. Mesmo considerando uma música não totalmente terminada, Hook afirma que ela é uma grande canção exatamente por isto.

“Insight” tem uma das linhas de baixo preferidas de Hook. Ao contrário das outras bandas, em que o baixista apenas segue as melodias da guitarra, no Joy Division era o contrário, as linhas de baixo eram feitas primeiro e a guitarra e os outros instrumentos deveriam seguir a linha de baixo. Outro destaque desta faixa é a bateria de Steve Morris, que mistura elementos acústicos e eletrônicos, um baterista que acabou desenvolvendo um novo estilo que influenciou muitos músicos.

“New dawn fades” é uma das melhores canções do Joy Division. Com um grande riff de guitarra e uma linha de baixo dilacerante, tem o fundo perfeito para a letra de Curtis, que fala sobre uma reflexão sobre o que talvez fosse a morte: “Oh, eu caminhei sobre a água, corri através do fogo / Parece que não consigo sentir mais / Era eu, esperando por mim / Esperando por algo mais / Eu, me vejo agora /Esperando por outra coisa”.



“She´s lost control” se tornou um dos maiores clássicos da banda. Isto se deve pelos experimentalismos feitos pela banda e pelo produtor Martin Hannet, transformando a canção em algo único e inovador. O som de um aerossol foi usado para criar alguns efeitos da bateria, além do uso de um sintetizador de bateria como um gerador de ruído branco, sendo Steve Morris um dos primeiros bateristas a usá-lo. Na letra, Ian Curtis fala sobre uma garota epilética que tem dificuldades de manter seu emprego e acaba morrendo durante um ataque. Uma letra totalmente autobiográfica, afinal Curtis sofreu até a morte com sua epilepsia.

Bernard Sumner queria que “Shadowplay” soasse como “The Ocean” do Velvet Underground. Uma música sombria e pulsante, que se tornou referência para o rock alternativo em geral. Sumner faz bons riffs de guitarra e segundo Hook, Sumner era um guitarrista subestimado às vezes, com grandes contribuições ao som do Joy Division. Na letra, Curtis fala sobre o submundo da sociedade, de forma ácida e sombria.



Sem falsa modéstia, Peter Hook fala que a linha de baixo de “Wilderness” é fantástica (e para variar, é mesmo) e é um ataque de Ian Curtis contra os dogmas da religião em forma de poesia. “Interzone” é o momento mais punk do álbum, com Hook fazendo os vocais principais e Curtis fazendo os backing vocals. Segundo Hook, Ian era legal neste aspecto, não tinha o ego inflado e deixava os outros integrantes cantarem se fosse necessário. O disco termina com a soturna “I remember nothing” com vários sons de vidros quebrados durante sua execução, outra ideia do produtor Martin Hannet.

Em Unknown Pleasures temos uma banda em seu auge criativo: um letrista fantástico como Ian Curtis, um baixista fenomenal como Peter Hook e instrumentistas que experimentavam ao máximo como Sumner e Morris, aliados a um grande produtor, que utilizou recursos inovadores de gravação como placas de eco e delays. Esta somatória de fatores transformou este álbum em algo único e definitivo dentro do rock, um dos discos mais influentes da história, sem dúvida alguma. 



21 de agosto de 2015

Dez anos do último disco de estúdio do Los Hermanos

Em 2005 saiu Quatro, último álbum de inéditas dos Los Hermanos. A banda após a turnê de divulgação deste disco anunciou um hiato em suas atividades, sem previsão de retorno. Desde então são esporádicos shows de reunião e discos solos lançados tanto por Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante, deixando uma legião de fãs à espera de um novo trabalho de estúdio.


Os Los Hermanos apareceram para o grande público no final dos anos 90, com o grudento hit “Ana Júlia”. O grupo surgiu em uma lacuna surgida no rock brasileiro dos anos 90, que tinha bandas como o Raimundos, com suas letras sacanas e debochadas e o Planet Hemp, com seu discurso favorável à legalização da maconha. Faltava uma banda com um discurso mais poético, que desse vontade de pegar o encarte e dar uma lida nas letras. Foi aí que os Los Hermanos conseguiram achar uma brecha e conquistar o público.

Com seu primeiro disco lançado em 1999, com uma mistura de ska, hardcore e letras românticas, o grupo chegou ao topo das paradas e teve “Ana Júlia” regravada até mesmo por uma artista internacional, Jim Capaldi, que teve a participação do eterno Beatle George Harrison na guitarra. Começava ali uma relação de amor e ódio, uns adoravam o grupo, outros já começava a odiar, devido principalmente e melodia grudenta de seu maior hit.


Em 2001 veio a grande guinada na carreira dos quatro barbudos. Bloco do Eu Sozinho foi lançado e mostrou uma banda muito mais madura e com músicas muito mais experimentais do que o disco anterior. A gravadora estranhou muito a demo que a banda fez para este álbum, a mudança no estilo musical e quase não lançou o disco. Foi ai que se separou o joio do trigo, quem eram os fãs da moda por causa de “Ana Júlia” e quem realmente entendeu o trabalho da banda e passou a seguir o grupo a cada novo álbum.


Com um considerável número de fãs conquistados em 2003 saiu o melhor disco deles, na minha opinião: Ventura é uma coleção de canções cativantes, que alinhavam bons arranjos de metais com letras com nível poético um pouco acima da média do rock nacional da época. Músicas como “O vencedor”, “Cara estranho” e “Último romance” viraram pequenas pérolas do rock brasileiro do inicio dos anos 2000, conquistando um número maior de fãs, em sua maioria, universitárias de cursos de humanas, que suspiravam a cada sílaba dita por Camelo e cia.


Em 2005 saiu o derradeiro disco do Los Hermanos, 4. Um disco bem mais introspectivo, sem o tradicional uso de metais e um clima mais triste e melancólico. Desde então saiu apenas um álbum ao vivo em 2007 e nada de um novo lançamento. As carreiras colo de Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante vão muito bem e os shows de reunião vão rendendo uma boa grana para a banda, afinal os caras tem muitas contas para pagar e é o trabalho deles, mas fica a sensação de um certo oportunismo, por que não lançar um novo trabalho então?

Talvez o fato de ter dois compositores na banda tenha acarretado em certo desgaste e competitividade entre os dois, afinal no primeiro disco eram 12 músicas de Marcelo Camelo e 2 de Amarante e no último vemos um equilíbrio, são 7 de Camelo e 5 de Rodrigo Amarante. Fica então a expectativa dos fãs de um dia os Los Hermanos se animem a gravar um trabalho com músicas inéditas, para o delírio dos fervorosos fãs e desespero dos tradicionais detratores do grupo. 


9 de agosto de 2015

Vímana – A banda mais famosa que ninguém ouviu

Imaginem uma banda com os seguintes integrantes: Ritchie, Lulu Santos, Lobão e o ex-tecladista do Yes, Patrick Moraz. Poderia ser considerada uma espécie de “dream team” do rock brasileiro, mas tantos egos juntos não poderiam dar certo e o Vímana não conseguiu ter uma carreira muito extensa.


Originalmente o grupo contava com Paulo Simas nos teclados e Candinho na bateria vindos da banda Módulo 1000, Lulu Santos na guitarra e vocais e Fernando Gama no baixo. Eles faziam apresentações e os quatro trabalhavam como músicos de estúdio para outros artistas. Com a saída de Cadinho em 1975, entram para a banda Ritchie e Lobão, tornando-se a formação mais conhecida do Vímana.

Com o sucesso das apresentações ao vivo a banda chamou a atenção da gravadora Som Livre e o grupo acabou gravando o compacto Zebra, que tinha no lado A a canção que dá título ao compacto e no lado B uma canção em inglês, chamada “Masquerade”. O Vímana chegou a gravar um disco completo com doze faixas, nunca lançado pela gravadora, que alegava que o público não estava preparado para o rock progressivo feito pelo grupo.


Ritchie disse que não sabe o destino das fitas masters com as gravações, mas suspeita que estejam no poder de Lulu Santos. Ele ainda alega que a banda na época era muito prepotente e que achavam que estavam mudando o mundo, mas na verdade estavam apenas mudando a vida deles. Ele, Lobão e Lulu moraram juntos por muito tempo e mantêm uma grande amizade até hoje, mas a disputa de egos era muito forte naqueles tempos entre os integrantes.

A coisa piorou quando o ex-tecladista do Yes, Patrick Moraz entrou para a banda no final dos anos 70, querendo fazer no Brasil uma versão tupiniquim do próprio Yes. Moraz, porém, odiava Lulu Santos e expulsou-o da banda, culminando com o fim do Vímana. Segundo as más línguas, um caso entre Lobão e a mulher de Moraz também contribuiu para o fim do grupo.


Ritchie costuma dizer que o Vímana é a banda mais famosa que ninguém ouviu. Uma banda que era promissora, com ideias interessantes, mas a dificuldade no relacionamento dos integrantes e a falta de interesse da gravadora culminaram com o seu fim. De qualquer forma foi o embrião de uma carreira de sucesso de artistas como Lobão, Lulu Santos e Ritchie, que nos anos 80 participaram de uma grande fase do pop rock brasileiro, algo que não se via desde os tempos da Jovem Guarda.